by Flávio Souza Cruz

quarta-feira 23 2003



Eu estou organizando a casa por aqui. Template novo, cara nova, problemas de informática velhos. Enquanto isso, vou iniciar aqui uma seção revival, colocando alguns textos do finado Hiperfocus. O primeiro é "Águas de Suor", que foi originalmente publicado em 12/7/2002 01:08:15 AM. Para aqueles que não leram, espero que gostem.


Se eu juntasse em minhas mãos todas as esferas da sabedoria, não teria hoje um canto para vos contar. Pois do leite esmaecido pela vaidade pedante que dos olhos em brasa me deram, soçobrou um lastro de apenas ternura para com os dias. Nada menos do que um doce canto de amargor e parca volúpia me sobrou no dia de Antares. E da festa esperada e por todos acolhida, me deram um ferrão de mandrágora à porta da igreja. Passeei sobre versos, sobre quermeces e pregações alheias para me ver ali como pátina mal armada, um cântaro vazio. Não sou mais o que quis um dia ser. Não sou mais o que sou neste momento, pois bebi de mim mesmo o acolher das rosas que sangram. Vermifuguei o fígado para aguentar as horas da espera. Mas dos vermes esperados, eu colhi apenas uma muda de eras. Me encolhi, me escondi na metástase da era. Sou agora um musgo podre no calcário que o mundo esculpiu. Sou casa, muro, muralha, nem gente, nem perda, nem era. E não peçam, oh meias verdades deste mundo a explicação deste lamento, pois não quero e nem posso vos explicar. Cortejei o mar ao ponto de me tornar cais, calejei o andar ao ponto de me esquecer das pernas. Não posso e nem nunca terei o direito de me enganar. E nem por mais, ou no mais o todo que me quiseram fazer vagar, voarei como dantes em teus pensamentos. Caí, me ocultei, mergulhei na terra do sertão. Quadriterra, quadrimundo de sei-não, torreei meus grãos no plantio de um falar zangado pela soleira do vento. E então cavo, cravo, arranco o anís de um cartel desenfreado.

Me dou o céu-mundo à Maria Jó. Querer-mor, querer mar, querer dó. Não faço, desfaço, desenrolo e desaveço. No mar, o sem-dó arranca a vida do acaso em nó. Soletro o quarto vento de Antares, numa remada em nó. Verteio, solfejo, só mesmo eu e Sá Sabrina e na queixada do pó. Me volto e reflito!? onde estou, onde estás?! Caminha hombre, veste a saraivada da morte. Enfrenta o caldo grosso da vida. Por que dos anos, tereis mais e de alegrias, um pano a mais. Fareis águas, derramarás águas, verterás águas de suor, de vinho, de carmas e lágrima. Será-serei a Terra úmida por veias tórridas de sangue. Amargo gosto de mim. Amarra o gosto de vós. E quero. E vero. E venho. E voto. E morro. Pois da peleja, volteei a corda da amargura e verei em berros e joelho ao chão, rezado e cajado em prumo, olhar fraterno, adeus desgosto.

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